Pedem-nos a escolha da personalidade que signifique o nosso país. Sugestão belíssima! As contradições avolumam-se. Há uma infinidade de opções divergentes. Cada português escolhe a personalidade que lhe traz mais carga emotiva, maior empenho político, maior evidência social. E aqui, à partida, a variedade de situações é divergente. É possível uma personagem do passado. Que diz esta personagem aos jovens do nosso tempo?
A minha geração sofre as consequências duma escola marcada pelos valores do passado. Eram estes os valores mais genuínos dum Portugal de sempre? Eram conceitos veiculados pelo Estado Novo, que tinha objectivos muito bem definidos.
Se olharmos para o presente, as dificuldades não são menores. Quem representa hoje Portugal? Os jogadores de futebol? Estes sobem ao pódio da imortalidade! Fogos-fátuos – passageiros! Numa breve geração quantos subiram e já derrubados? Em que ficamos? Um industrial, um político? Um governante? Um músico? Também constatamos como é efémera esta glória…
Mas temos de escolher!
A minha opção fundamenta-se em valores humanos. São eternos. Só o que é humano ultrapassa o tempo e se impõe naturalmente a todas as gerações. São universais! Valores da vida!
Apresento duas personalidades que admiro: o Dr. Aristides de Sousa Mendes e o Professor Abel Salazar. Divido-me entre estes dois. Têm características diferentes. De comum, ambos enfrentaram a política caseira e mesquinha de Salazar.
O Dr Aristides, homem de acção, prático, ajudou os numerosos judeus que procuravam uma saída oposta aos campos de concentração nazi. Numa semana, terá salvado milhares de judeus, concedendo passaportes. Salazar considerou uma afronta. Não lhe perdoou! Condenado ao desemprego forçado, humilhado, acabou os seus dias numa miséria imerecida. O seu nome ficou na lama; a sua família ostracizada. Abril recupera-lhe o nome, reconhece-lhe mérito e apresenta-o como exemplo às gerações vindouras. Homem de corpo inteiro!
O Professor Abel Salazar é um homem completo. Um verdadeiro humanista no século XX: professor, pintor, escultor, gravador no cobre, escritor – educador! Foi opositor ao Estado Novo. Esta sua atitude mereceu-lhe a expulsão da Universidade. Alma de lutador! Nunca cedeu. Morreu afastado do seu meio. Mesmo o seu funeral foi rocambolesco, vigiado pela polícia do estado. Hoje, Abel Salazar está recuperado. È o patrono da Faculdade onde leccionou: Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar. A sua memória merece reconhecimento e admiração.
Estas duas personalidades conquistam-me. Dou prioridade ao Dr. Aristides Mendes pela sua sensibilidade e coerência que o levou a esta desobediência pública.
Joaquim Soares - Janeiro de 2007